terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Uma Polaróide

Naquela foto você estava distante, como quem toca o horizonte com o olhar, como quem sabe do que não sabemos, como quem desconfia de toda verdade. Naquela foto você estava como quem cansa de estar imersa no tédio das obviedades do mundo ou como quem sente as verdades do mundo cortá-la ao meio tal qual uma brisa matinal... Aquela foto era você e suas confissões; era você e seu mundo, seu reino, que não pertence a essa realidade; seu reino intangível, comunicável apenas pela foto, por aquele sorriso tangível quase Cartesiano...


Xico Fredson!

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Texto para minha menina...

Desisti de procurar a verdade das coisas. Desisti também de querer encontrar a verdade nas pessoas. A perfeição? Dessa eu já abdiquei faz tempo. Como diz um poeta: ela está sempre quinze léguas à nossa frente, e nossas pernas são curtas para alcançá-la, muito embora a comamos com os olhos cotidianamente... Desisti de um monte coisas. Estou adiando alguns sonhos pra depois de amanhã. Estou deixando que os aviões partam, que os navios zarpem e levem um pouco de mim em seus destinos e lancem-me feito semente nalgum lugar, nalguma parada. Um pouco de mim está lá, mas a maior parte ainda está aqui; é essa parte que não desistiu de acreditar que amar é possível e que nem tudo é mercado, que nem tudo é consumo, e que ainda há tempo para se mandar flores; para se escrever poemas; para olhar nos olhos e dizer afetos sem tremer ou temer o poder das palavras e das respostas... Essa parte é o que há de melhor em mim. A parte que não cansa de procurar. Que buscou, busca e sempre buscará o Porto Seguro de que falavam os navegantes portugueses ao se referirem à sua pátria-mátria... Essa parte de mim é o que escreve, é o que sempre escreverá poesia ou textos, mas sempre escreverá e sempre sonhará com ela, a esperança...

Xico Fredson!

Resposta de Ana a Francisco

Francisco,
Não vou dizer que ler a sua carta não me abalou, eu estaria mentindo. Dizer também que ao terminar de lê-la não me veio aos lábios um sorriso nostálgico, seria outra mentira da minha parte. Confesso que já me considerava curada de você, me achava forte, uma verdadeira muralha intransponível aos sentimentos.
Posso lhe afirmar que havia encontrado a paz e a comunhão comigo, mas depois que comecei a ler as suas cartas, muito embora ao receber sua primeira correspondência, eu tenha lutado contra a curiosidade do seu conteúdo, mesmo sabendo quem a remetia, certos momentos e emoções, que eu achava ter sepultado, voltaram a existir, ressuscitaram em minha imaginação, e sua lembrança passou a me envolver como a mao fria de um fantasma que provoca calafrios no corpo durante a madrugada...
O incrível é que voce ainda consegue me tirar de mim e me lançar em épocas tão boas, e eu nem esboço a menor resistência. Realmente aquela praça ficou marcada em nossas vidas, foi onde tudo começou, nosso marco zero, o primeiro beijo, as primeiras caricias, as primeiras discussões, a primeira vez que dissemos um breve adeus, a primeira vez que me deu flores, as minhas preferidas, lírios e margaridas, rosas salmom e rosas brancas, o buquê era lindo, um arranjo muito bem feito, e voce todo sem jeito andando com o buquê na rua, vindo em minha direção, e eu sem acreditar no que via...
Aquele foi o palco onde encenamos o começo de nossa vida, onde tivemos nossa primeira discussão, onde terminamos e recomeçamos, aquela pracinha foi o nosso gênesis e o nosso apocalipse...
Era la que ficávamos sentados observando as pessoas que iam e vinham...
Xico Fredson!

Meu poema de sete faces...

Quando nasci todos os anjos estavam de folga ou férias coletivas. o céu estava em greve. Perdi a chance de ser Gauche, de ser Carlos, de ser poeta, mas nasci torto do mesmo jeito e com um sorriso desencontrado, e me chamaram de Xico, acho que pareço mesmo com Xico e não com poeta, porque Xico é nome de qualquer coisa, menos poeta que se prese nem se pese...
Xico Fredson!

A menina I

Para Elândia, com carinho...
A menina, então, depois de se terem passados alguns minutos de reflexão sobre o que era a vida, chegou a mesma conclusão que todos chegam: não há como se chegar a grandes conclusões a respeito duma coisa que está em constante mudança, em movimentos de idas e vindas nada periódicos, sempre no capricho cruel de um recomeço, de uma refazenda. Ela aprendeu o que todos aprendemos, "a vida é o que fazemos dela" e que ela atende pelo nome que a dermos: alegria, ânsia, tristeza, felicidade, urgência... A menina resolveu que chamaria a expectativa de vida que acabara de nascer com aquele novo dia de "diferente", e com essa esperança levantou-se e com essa vontade viveu o dia de ontem, até amanhecer o dia de hoje...

Xico Fredson

A outra parte...

Hoje estou assim como se não houvesse ninguém em mim, estou parecendo uma casa vazia, silenciosa e morta como um espelho que não tem o que refletir. Resumindo, é como se eu tivesse caído e me partido em um monte de coisas: Ansiedade, Frustração, expectativas... É tanta coisa, meu Deus que nem sei pra onde ir ou por onde recomeçar. Estou com vontade de sumir, de esquecer meu nome e tudo que nele se guarda: meu credo descrente por modismo, minha razão apaixonada, minha vida vivida e todo o resto. Como disse: não sei nada do mundo e da vida. Quero a ânsia de perplexidade que buscas.

Xico Fredson

Uma Parte do todo...


Moça, a minha tristeza hoje é como a de tantas outras pessoas que passam por mim. Essa tristeza que sinto é feia como um dia nublado, assustadora como um trovão que estronda de repente, sem pedir licença; triste como uma igreja vazia de Esperança e Fé; iguala-se, mesmo, a uma grande avenida cheia de rostos desconhecidos e olhares indiferentes diante das outras pessoas, que se tornam invisíveis diante da pressa e da urgência de chegar até lá... sorrisos executivos amarelos e cinzentos da cor dos arranha-céus onde vivem.
A tristeza que hoje sinto é a mesma de alguém que esperava ansiosamente pelo entardecer para ver o pôr do sol à beira mar, às cinco e meia da tarde, mas caprichosamente, de repente cai um “pé dágua” frustrando a espera poética. Hoje me acho melancólico como a cena urbana que se pinta em bares e restaurantes dos pequenos e grandes centros, o que muda é apenas a classe que reveste a solidão de uma pessoa qualquer, sentada à mesa de um bar, com um cigarro em uma das mãos, uma garrafa de cerveja ao lado de um copo da mesma bebida, tendo em uma das mãos um celular que não “chama” e outro que não é “chamado”...
Minha tristeza hoje é comparada a de um cais sem barco; de um aeroporto sem avião, de um céu com uma lua distante, de um sorriso que segue em um coletivo que passa por mim muito rapidamente. Minha tristeza é assim, definível, palpável, friamente próxima de mim, quase sou eu a lamentar por aquilo que não foi. Minha tristeza está ligada a ausência que os meus olhos sentem de fazer leitura silenciosa do teu corpo, dos teus lábios, do teu sorriso, de você. E de não saber se tudo isso é apenas um poema de amor e saudade e tristeza ou se é amor ou uma forma de amar...
Xico Fredson!

Para escrever

Para escrever uma poesia é preciso
Algumas folhas de papel em branco,
Onde possa colocar minhas impurezas...
Uma caneta.
Uma mesa,
Uma cadeira.
Uma xícara de café.
A sinfonia da noite.
O barulho do dia.
E, acima de tudo, paciência,
Para esperar que a poesia bata a porta,
Brote na aorta,
Sem hora marcada, perguntando se pode entrar.
A poesia é caprichosa, precisa encontrar alguém que
Esteja sempre disposto a escutar suas histórias,
Que vão do absurdo as mais sublimes declarações de amor.
Para ouvir o que essa dama tem a dizer, deve-se ter paciência,
Porque ela sente urgência em se expressar
A todo instante, e nas mais inconvenientes horas do dia ou da madrugada;
Outro equipamento fundamental para o poeta,
É uma cama, para deitar-se quando cansar de esperar
Que a poesia venha,
E é como se ela ficasse a espreita como uma raposa velha, esperando
Que o poeta durma, que o poeta sonhe, que o poeta sorria...
Só para trazê-lo de volta para o mundo donde ele foge sempre...

Xico Fredson!

Oração para Fulana

Teu corpo é meu pão e teu gozo é meu vinho. Somente diante de Ti eu me ajoelho e rezo uma oração amorosa, bem-dizendo-te: ave Fulana, cheia de graça, de formosura e de amor... Apenas diante de ti eu confesso os meus pecados mais íntimos, confesso-os em língua mais que viva: ansiosas por darem-te forma através das palavras. Fazer o verbo do teu nome, dar forma a carne do meu desejo... Amém, Fulana, por habitar em mim, em meus pensamentos, em meus desejos, em cada movimento do meu corpo, que se dilata ante a tua imagem. Em cada movimento do sangue que corre em meu corpo. Amém Fulana! Mas Fulana é tudo e está em tudo, Fulana é uma flor, fulana é o nome da Rosa; Fulana é arvore que dá sombra para que eu descanse o meu corpo; é água que corre para o mar, mas que antes mata minha sede. Fulana é o que e penso, é minhas idéias, é minha poesia, é essa oração. Fulana é uma menina com um flor no cabelo e um sorriso de quem acabou de ganhar um novo, uma nova alegria. Fulana é a simplicidade de uma capela e a força de sua fé... Reine sobre mim, Fulana, reine sobre meus pensamentos e sobre minhas angústias. Deixa-me deitar em teu colo e esquecer esse momento. Proteja-me, Fulana, com as suas orações, com a sua fé. Dá-me o conforto que esse momento não me tem dado. Reine sobre mim, Fulana, reine sobre meu coração, reine sobre o tempo, reine sobre a cura. Em teu colo entrego meu corpo, minha alma e meu coração. Reine sobre mim, reine sobre mim... Reine sobre mim e me refaça. Blinda-me com tuas asas e com teu corpo. Deixa-me comer do teu Pão e beber do teu Vinho, para que a Paz possa reinar novamente sobre mim...
Xico Fredson!

Fulana II

Ela me sorriu um sorriso tranquilo; ela me olhou com olhos de caleidoscópio e eu me perdi no meio de tantas estrelas; ela passou por mim com cheiro de rosas, ela não sabe, mas aquela hora da manhã tudo parou pra mim e tudo o que pude observar foi o seu caminhado leve, poético e tranquilo, indo pra onde eu nao sei, ela dobrou a esquina e tudo voltou ao seu rítmo normal, o mundo voltou a ser o que é, e as pessoas voltaram a ser apenas pessoas que seguem em seus carros, em ônibus, motos, bicicletas... e de todo aquele dia só me restou a lembrança daqueles olhos castanhos, daquela pele, daquele sorriso e daquele cheiro. Até amanhã Fulana e seus enigmas!

Xico Fredson!

O feitiço dos Versos

O feitiço dos versos

Quando era mocinha, acho que tinha uns 15 anos e um mundo de sonhos na cabeça, minha mãe me pegou num flerte infantil com um um menino que morava na mesma rua. Ela não brigou comigo como seria natural que fizesse. Ela olhou pra mim com aqueles seus imensos olhos castanhos e me disse em um tom até então desconhecido pra mim: Tenha cuidado com os versos minha Filha, muito cuidado. Eles seduzem mais que uma bela imagem de homem que se faz silêncio, que sorri e mastiga com a malícia no olhar... Os versos minha filha, são mais perigosos que o Boto Rosa das histórias que eu te contava até ontém... este pelo menos leva de você o que quer e depois a devolve na beira-mar, aquele te embriaga com palavras, sussuros e canções, e depois disso não te devolve a ti como eras antes... Os versos minha filha, cuidado com os versos! Como eu não tive...


Xico Fredson!

O Baile

Pequena História de uma pessoa que amava, mas que não tinha as palavras certas para dizer isso quando era preciso, e vivia como no refrão de uma música que dizia assim: Na hora da canção em que eles dizem Baby, eu não soube o que dizer. Era exatamente assim que eu me sentia. A música passava, e o tempo escoava, e a oportunidade se ia, e a vida idem, até que chegou o próximo baile no mesmo salão, com a mesma banda, e por pura coincidência ou capricho do destino, isso pra quem acredita nessas coisas do Oriente, romances astrais... Confesso que não acreditava, mas depois de tudo, mudei de cético para crente. Então eu a reencontrei, convidei-a novamente para dançar, senti tudo outra vez: o mesmo frio no estômago, a mesma ansiedade no calar da voz, o mesmo tremor nas mãos que seguravam a cintura dela enquanto dançávamos. Parecia que tudo estava preparado como se o Baile nos desse uma segunda chance para que ficassemos juntos, dependeria de mim agora, dançarmos apenas aquela música, ou continuarmos a dançar outras músicas por muitos e muitos anos. E aquela hora surgiu novamente, a hora da canção em que eles dizem Baby... Continuei sem saber o que dizer, e por impulso e medo de esperar um novo baile, eu a beijei em silêncio, em silêncio perrmanecemos até o fim do baile, que ainda não acabou.................. É isso!

Xico Fredson

Palavras...

Minhas palvras são sérias, burocráticas, escavadas das páginas do dicionário, escravas do Aurélio, são sempre assim, sérias como sérios são os dias nas repartições públicas (há quem ainda acredite nisso?). Minha poesia e descompromissada com tudo, inclusive comigo, ela anda por aí, pula muros, rouba flores, frutos, olha a brecha da moça ao mesmo tempo que a flerta; canta e dança, mesmo sem saber; assovia, paquera, faz amor, viaja, vai a lua, passa dias em marte... ela segue no gerúndio... indo...indo... partindo, sumindo. Minha poesia é descompromissada com o tempo, e com o espaço que vai ocupar... cabe em uma folha A4 ou num guardanapo. É caprichosa e ansiosa, procura sempre o melhor do meu sono para me acordar e me contar das coisas que viu por onde andou. Quando pergunto a ela o porquê de sempre fazer isso, ela me responde com sorriso de criança danada: sou livre e quem mandou você amar os versos livres...
Xico Fredson!

Eu...

Sou dessa gente calada que é doida pra falar palavra fácil, sem modismos ou vícios intelectuais, dessa gente que nao sente o fetiche esculhambado que molesta as palavras - coitadas - e afasta delas quem mais precisa. Palavras, assim simples como a gente que caminha no meio da rua, porque foi expulsa de suas calçadas e às margens já não os comportam; palavras com gosto de café e cheiro de noite, palavras que tenham insônia e que tenham ânsia de serem ouvidas por ouvidos de Lua...Palavras que são sérias e comprometidas com os ouvidos de quem as lê. Queria poder escrever palavras assim, que fizessem sorrir, que fizessem chorar, que servissem praquela moça bonita se olhar nelas e deixar o seu espelho de lado. Há mais beleza nas palavras que nos reflexos...Xico Fredson!

Leveza


Hoje eu queria ter a leveza e a alegria dos que sabem dançar; a felicidade dos que acabam de ganhar um presente; a sinceridade dos que não aprenderam a escrever; a paciência dos que aprenderam a envelhecer; a ansiedade dos que esperam o primeiro beijo; o espanto dos que acabaram de nascer; a fé inabalável dos fiéis; a atenção de minha mãe assistindo a uma novela das oito; a simplicidade de um Haicai;
A beleza do sim; o tristeza do não; minha alma que caiu da carteira quando pagava uma conta no bar; o amor do Pastor Amoroso; o nome daquela Rosa que nem sei se se chama Rosa, mas que tem o cheiro do campo e a alegria de pássaros tomando banho numa poça escondida entre matos...
Hoje eu queria a leveza, a insustentável leveza do teu ser, Rosa, que nem sei se se chama Rosa, mas que tem cheiro e jeito de mato e de rosa...

HABEAS CORPUS


Hoje vou reinventar a minha vida, não vou trabalhar, não vou estudar, não vou fazer nada que pareça útil aos olhos da sociedade, vou dormir até mais tarde, vou observar meu filho brincar, vou andar descalço, ficar de pijama na sala, não vou ler o jornal, não vou assistir à tevê, não! Vou ouvir música, vou ver meus vídeos antigos, reler cartas que meu amor me enviava quando éramos jovens e estávamos juntos até em pensamento, vou rever os velhos álbuns de fotografia, ouvir as velhas músicas daquele tempo, enfim, vou fazer tudo que não faço há anos, desde que eu deixei de viver e passei a ser mais um a engrossar a massa de profissionais que se desprendem de valores e prazeres antigos.
Vou levar meu filho à escola, vou apanha-lo mais tarde, vou assistir ao seu treino no futebol, vou torcer por ele no campeonato da escola, vou tomar sorvete com ele, vou soltar pipa na rua, vamos andar de bicicleta, juntos, por longas horas, e conversar sobre as coisas mais diversas, quero a sua amizade e o seu amor.
Vou amar minha mulher como se fosse a primeira vez, quero sentir o mesmo nervosismo, a mesma ansiedade, o mesmo desejo, tudo de novo. Quero olhar novamente nos olhos dela e repetir todas as juras que fizemos na adolescência, quero pedi-la em namoro, vou me casar novamente com ela, quero convidá-la a envelhecer junto comigo, irei dizer-lhe coisas que nunca fui capaz de falar antes, quero surpreendê-la. Quero pedir desculpas por todas as vezes que não disse o quanto a amo e o quanto ela é linda e me faz bem. Quero dizer a ela o quanto ela torna minha vida mais fácil de ser vivida, acho que o que quero realmente dizer é que sem ela não existiria um eu.
Vou cuidar de minhas plantas no quintal, vou voltar a ser criança. Subir em árvores, pegar a fruta no cacho, aproveitar mais a vida, viver!!! Vou fugir do sistema que me oprime, vou cometer um homicídio contra o executivo que há em mim e vou ressuscitar a criança que vive presa ao meu relógio, ao tempo que nunca dá, que sempre é escasso. Preciso sentir fome de viver novamente, preciso aprender a conjugar o Carpem dien como os antigos faziam e viviam tão bem.
Quero reaprender a sorrir sem ligar pra o que digam, vou deixar de viver minha vida pautada na opinião dos outros, vou cantar aquela canção que me ajudou a conquistar aquela menina com quem vivo até hoje e de quem não me quero separar jamais. Espero que o disco continue a tocar até... o outro baile da vida. Reunirei a família para fazermos aquela viagem que a gente vem combinando há tanto tempo, vamos para qualquer lugar onde haja um mar, onde eu possa ver o pôr-do-sol, onde eu possa me extasiar com o brilho da lua na areia, navegarei, andarei descalço naquela área que fica entre o mar e a terra; sentirei a brisa, o frio, abraçar-te-ei, beijar-te-ei, contemplar-te-ei como um monge contempla a natureza.
E depois de tudo isso, se eu tiver esquecido alguma coisa, por favor me ajude, caro leitor, acrescente seu pensamento, seus desejos e aventuras; conjugue seus verbos exorcize seus medos; recite uma poesia, ame alguém, bendiga o nome da pessoa amada, sinta saudade dos velhos tempos e, se possível, volte a eles, volte a sua infância, a sua adolescência ou àquele lugar onde você se sinta feliz, continue a escrever essa crônica de onde eu parei, TOME-A, ela é sua! redija o que lhe convier, o que lhe agradar ou o que não lhe agradar se for o caso, mas redija algo, o tema é livre assim como você....

Fredson...

Tava pensando na vida...



Enquanto você fica aí pensando na vida, esperando a banda passar, as coisas continuam a acontecer no mundo, algumas oportunidades estão surgindo, outras estão desaparecendo, pessoas estão se conhecendo e outras estão sendo deixadas de lado, casamentos e divórcios, a paixão do poeta que renova todas as coisas e a lágrima do palhaço que continuam a lavar a medalha do vencedor, o suor continua a ser a essência do honesto, a bic o instrumento do sonhador e a caneta de ouro o bisturi do corrupto, que abre feridas no peito do trabalhador que perde sua dignidade e ganha o desespero como salário, ao ver seu pagamento ser desviado para contas fantasmas em paraísos fiscais.
Enquanto você fica imaginando um mundo mais justo, pessoas morrem de fome, crianças são assassinadas, famílias são humilhadas, feitores recebem farda, velhos são obrigados a trabalhar para não morrerem de fome, aposentados são chamados de vagabundos, o direito a ter direito é omitido, a educação está cada vez mais distante do ideal, pessoas aprendem a ler e a escrever, mas não aprendem a interpretar, não são estimuladas a pensar, pelo contrário, são induzidas a pensar da forma “certa”, da forma conveniente, as pessoas não pensam, elas simplesmente vivem “achando isso ou aquilo das coisas.”
Enquanto você pensa na vida, o gosto pela leitura desaparece cada vez mais, a televisão mostra tudo, basta assistir ao jornal pra ver como aquele fato aconteceu realmente, a verdade é colorida e tem tamanho, pode ser de 14, 20 ou 29 polegadas. Enquanto voce dorme livros continuam a ser queimados em praça pública, pensadores continuam a alimentar as chamas da inquisição da mídia, historiadores continuam a ser desmentidos pelo sensacionalismo das noticias criadas pra maquiar o rosto da verdade.
Enquanto voce dorme e sonha com um futuro melhor, este fica cada vez mais difícil e distante. O profeta tinha razão quando disse: “...e o futuro não é mais como era antigamente...” o futuro é cada vez mais incerto, faz tempo que o sol não nasce pra todos, e o fato de sermos livres começa a ser questionado, livre pra quê? pra continuarmos a dormir e a teorizar revoluções?
Enquanto voce pensa na vida e espera a banda passar, não percebe que o universo continua sua expansão, que as calotas polares continuam a derreter, que o capitalismo está com os seus dias contados, que a camada de ozônio já era, que os X-mens estão chegando, que Mefistófeles venceu e não adianta ao senhor Fausto se arrepender, sua alma não é mais sua, ela é do capital mefistofélico.
Voce por mais que renegue é um ser capital, vive do capital e para o capital, seus sonhos mais secretos dependem do capital para se realizarem, o romance ideal depende do capital, a felicidade depende daquilo que vivemos a negar, mas que não compramos sem o fruto da nossa negação, dependemos do antagonismo, nossa essência é socialista, mas a realidade é capitalista. E voce tem medo de abrir os olhos e fazer a revolução, por que sem o capital como você vai viver e pagar suas contas, e ter suporte pra idealizar revoluções, e criar discursos pra movimentar as massas de mendigos, os soldados que um dia instalarão a tão sonhada “Ditadura Proletariado”?
É, enquanto voce pensa, estrelas continuam a nascer e a morrer, buracos negros continuam a absorver toda a luz do universo e o capital dentro em breve vai destruir o mundo em que vivemos, os capitalistas são os lobos do mundo, será que a voz de um anjo sussurrou isso em seu ouvido enquanto voce pensava, vamos apelar a hierofania, será que Ele salva? será que Ele quer salvar? será que não tem nada melhor a fazer? Será? Será? Será? O sofrimento do mundo, será realmente uma vontade Dele, um teste de sobrevivência para a eternidade?...ou será essa mais uma ideologia criada e usando seu nome em vão? Será?
Enquanto você pensa, a vida não pára, novas bocas nascem, a cidadania continua ignorada pela maioria que vive batendo no peito dizendo ser cidadão sem entender o que fala, sem saber o que é ser cidadão, sem saber o que é ter direito, a cidadania é mais uma letra morta. Enquanto voce pensa na vida, novas guerras surgem a todo instante, guerra pela paz, pelo petróleo, pela vida, guerra pela guerra, guerra, guerra e mais... guerra! Bummmmmm!!!
Enquanto voce pensa na vida, eu continuo a procurar pelas mudanças que li na camiseta de uma sonhadora, lá estava escrito quer “a única coisa constante no mundo em que vivemos é a mudança”, o engraçado é que quando perguntei a ela como ia a vida, como ela estava... ela foi categórica em sua resposta “é que está tudo na mesma, nada de novo”, discurso (in)condizente com a prática.
A única certeza é a de que a terra continua a girar, as estrelas ainda brilham, não sei se já morreram ou se ainda vivem, nem tão pouco por quanto tempo vão continuar com esse brilho, outra coisa certa é que o universo continua em movimento e que voce continua só, vivendo com suas contradições e teorias de conspiração dentro do seu mundo paradoxo, só com suas certezas, com sua filosofia que um dia irá mudar o mundo, só com sua postura de achar que um dia tudo vai mudar a partir do acaso sem luta, ignorando o que o mesmo Che que ostentas na camiseta vermelha ou como amuletos presos ao pescoço disse: “não se faz revolução apenas com sorrisos, é necessário sangue, suor, solidão e renuncias”... (a cor de uma camisa não indica sua postura) as coisas não serão melhores...não haverá mudanças.
Será que quem espera sempre alcança? Quem dorme tem algum outro direito além de sonhar? Será que não é hora de parar de pensar, e agir? (ao invés de esperar a banda passar, será que a banda já não passou?) Faça sua banda e crie seus hinos... “escreva sua historia com as suas próprias mãos” pois a banda já passou faz tempo, e não pensa em voltar, ela é como um raio...


Xico Fredson!

UM MUNDO INCOLOR


Como seria o mundo sem poesia?
Alguém, de imediato, poderia dizer que nada seria alterado, tudo permaneceria na mesma.
Creio que não seria bem assim. O sumiço da poesia implicaria no desaparecimento, em cadeia, de uma serie de outras coisas, inclusive de nós mesmos.
Qual seria o sentido da existência das flores sem alguém para recebe-las? A entrega das flores é o primeiro e mais poético gesto de amor.
E o que dizer dos livros, qual seria o sentido de se escrever um romance sem poesia?
Nossa alma desfaleceria de inanição, embora o nosso cérebro se fartasse de obras racionais!
Sem poesia não haveria beleza e sem beleza não haveria o mais sublime dos poemas – a mulher – sem a mulher nada teria sentido em existir. Não existiriam as músicas, não existiria o desejo, não existiriam os heróis, imagine Lampião sem Maria Bonita, Orfeu sem Eurídice, Dante sem Beatriz... imagine eu sem você.
Pense na tristeza que seria uma noite sem luar, uma boca sem um beijo, você sem alguém em quem pensar.
Imagine um mundo sem Fernando Pessoa, sem Álvaro de Campos, sem Alberto Caeiro, a apatia que esse mundo teria sem Carlos Drummond Andrade, sem Manuel Bandeira, sem Pablo Neruda, sem Cora Coralina, sem Irene, sem Ana... um mundo visto dessa perspectiva, seria como um lugar que ainda não veio, que ainda habita o escuro ventre das idéias.
Sem flores não há fruto, sem fruto não há poesia, sem poesia não há vida, há o caos.
Imagine nunca mais repetir a frase “eu te amo” pra alguém; e o que dizer de nunca mais poder fazer aquelas promessas absurdas que só o amor nos induz a fazer; e nunca mais ter com quem brigar...
Imagine como a vida seria chata sem a guerra apaixonada dos amantes, aquela onde o campo de concentração é a cama vazia na solidão. E não mais sentir aquela coisa boa que é fazer as pazes, já que a paz dos apaixonados surge após varias missões diplomáticas, que começam com buquês de rosas, com cartas recheadas com o mais puro arrependimento e o mais sincero amor, diversos e diversos presentes, e depois de tudo isso... ah! Só aquele que já fez as pazes sabe o que acontece depois. Cada um recebe a paz e as delicias que o pós-guerra traz a sós e da maneira que lhe convém...
O mundo sem poesia seria um mundo em silencio...
Imagine você não ter por que lutar...
Não ter por quem esperar...
Não ter a quem amar...
Não ter a quem ouvir...
Não sentir aquela força arrebatadora que nos tira de nós, que nos desconcerta, que nos desconcentra. Não sermos mais traídos pelos nossos sentidos, não sermos mais ludibriados pelos nossos olhos a tramarem contra nós, afinal, quem nunca confundiu alguém que passa na rua com a pessoa amada? Seja pela maneira de andar, ou mesmo pela forma como se veste.
Quem nunca sentiu a fragrância inesquecível daquele perfume que caracteriza o cheiro do amor e não viajou na lembrança?
Quem nunca ouviu uma musica e personalizou na pessoa amada?
Você pode estar se perguntando o que tudo isso tem haver com poesia, se até agora só me arremeti a casais e ocasiões envolvendo-os?
Digo-lhes que como poeta, enxergo tudo ao revés, ou seja onde olhos comuns vêem apenas um casal, eu vejo poesia, porque o casal é a poesia que se faz carne, o beijo é o começo do sonho e um filho é a síntese de tudo...
Pois é no dialogo entre duas pessoas que se amam que estão os mais belos versos de amor, por que as promessas feitas no silencio de um beijo, na penumbra da sala, é um poema. Já que sem poesia, não existiria Deus, não existiria mundo e não existiríamos, porque no principio era o verbo intransitivo, o amor, e sem ele não há poesia.

Xico Fredson!

Perguntas a Clarissa


Clarissa, minha angústia é não ser todas as coisas; é não conhecer todas as coisas que gostaria de conhecer; é não sentir todas as sensações. Minha dor, essa mesma que me inquieta e que me tira o sono, me tira o chão, me tira de mim, me tira de ti, me tira de tudo. Essa dor-inquieta é, também, saber que mesmo estando um pouco em tudo, não estou completamente onde quero estar, em quem quero estar...Minha dor é, resumidamente, saber que não sou Deus, muito embora dele eu só quisesse suas impossibilidades: onisciência, onipresença, onipotência, oniprepotência... Oniqualquercoisa que me fizesse um instrumento de minha Paz. Diga-me Clarissa, onde vou buscar tudo isso? Em que livro posso encontrar a minha paz escrita? Em que lugar, em que esquina do espaço-tempo eu deixei cair minha carteira com meu lenço, meus documentos e tudo que me faz lembrar de mim. Onde Clarissa, onde? Será que o seu amor seria suficiente para me devolver o eixo? Será que você voltaria comigo aquele espaço-tempo e me ajudaria a encontrar quem eu fui? Será que valeria a pena...?!!


Xico Fredson

Desiderato

Hoje, mais que ontem eu queria ter asas e sair voando pra longe de tudo o que conheço. Deixaria em casa meu registro de nascimento, para esquecer que nasci e pensar na possibilidade de ser outro. Deixaria também minhas contas a pagar, para ter um pouco da noção de leveza e liberdade que tinha quando criança. Gostaria de ter asas para sobrevoar as coisas grandes e ver como são pequenas, e que nada supera o infinito que somos e não sabemos. Queria, mesmo, ter asas e sair por aí, mas não sei se gostaria de ter asas para voltar...

Xico Fredson

Uma canção de amor pra Rosa, Flor de Laranjeira


Rosa, Flor de Laranjeira, vou te cantar uma canção que começa assim: de todo aquele amor, minha Rosa, restou apenas este poema, o gosto do seu beijo, as promessas feitas, os planos não concretizados, a lembrança dos olhos se fechando como num ritual, antes de nos beijarmos; as brincadeiras antes de irmos dormir; o som e o frio da noite, o nascer do dia, o banho frio, o beijo na testa, as folhas caindo, as flores surpresas; o eco das conversas ao pé do ouvido, as brigas e as tréguas, as discórdias passageiras e os beijos longos e apaixonados... O aroma do perfume que você costumava usar quando íamos nos encontrar, que me embriagava; a lembrança do seu modo de olhar pra mim, como se me despisse até a alma com o desejo que saltava através dos seus olhos, das palavras e dos dejesos tantas vezes confessados na entrega do Corpo, que eu comia como Pão, e do gozo, que eu bebia como vinho. A maciez da sua pele; a magia da sua voz cantando aquelas músicas que ficavam no lado B do disco; o seu jeito de caminhar em minha direção sempre com um olhar inquietante; a lembrança da sua imagem sempre pensativa, como naquela foto em que você é flagrada pela lente da máquina olhando para o horizonte enquanto mexe no cabelo, enrolando-o nos dedos, imagem essa que o tempo não vai desbotar tão cedo; de tudo isso sobrou um pouco, um pouco de tudo em mim: um pouco do medo, um pouco da ansiedade que nos flertava, um pouco da paixão que nos cercava, o refrão daquela música que sempre fica, assim como o perfume que teima em não sair da roupa e do corpo e da lembrança e da noite alta e clara de lua cheia em que costumava virar bicho, mas que agora eu apenas exercito a minha paciência e a minha imaginação. De tudo isso ficou um pouco, é o que restou desse pouco, que pouco a pouco começa a se desligar de tudo, de mim, de você e do “nós” que um dia se conjugou em nossas orações, sempre com verbos no futuro do presente, e que hoje estão pouco a pouco se conjugando no futuro do pretérito, minha Rosa, Flor de Laranjeira...



Xico Fredson

A gente...

A gente vive às pressas;
A gente ama às pressas;
A gente come às pressas;
A gente dorme às pressas;
A gente sente às pressas;
A gente lê uma poesia às pressas, e não a compreende;
A gente assiste a um filme às pressas e não o sente;
A gente olha um quadro às pressas e não o capta;
A gente cria os filhos às pressas e não os vê crescer;
A gente se fala às pressas e não ouve o que diz;
A gente se beija às pressas e não sente o gozo do beijo;
Despede-se às pressas;
Faz amor, imperfeitamente, às pressas.
A gente sorri às pressas
A gente reza isso quando, às pressas;
A gente acredita na existência às pressas
A gente sonha e acorda com pressa
A pressa nos tira o significado das coisas da vida
Faz-nos ficar cegos de uma cegueira branca;
A pressa nos tira o humor, a paciência, a vontade de viver.
De sorrir, etc.
A pressa não é apenas inimiga da perfeição, ela é nossa inimiga
Íntima, nossa condenação ao sofrimento e ao vazio...
A gente ama ao próximo com medo de não dar tempo
de amar a mais ninguém,
A pressa tira o gosto do beijo que antes escorria pelos nossos lábios,
Tudo culpa da pressa, até mesmo à vontade de arriscar alguma ação é-nos
Sufocada pela pressa de não dar tempo. É a força do imediatismo,
Que substitui a paciência necessária para se viver em harmonia
A pressa nos tira vários prazeres, desde os mais simples,
Como parar de fazer alguma coisa para observar um pôr-do-sol,
Até o prazer de acompanhar o desenvolvimento físico e intelectual
Dos nossos filhos, prazeres como ajudar no dever de casa, ouvi-lo falar.
Em como foi o dia de aula, em responder aqueles porquês que vão evoluindo.
Paulatinamente logo logo, a gente está sem respostas que os satisfaçam...
A pressa às vezes nos deixa ultrapassados de alguma forma,
A pressa é especialista em nos causar arrependimentos inúteis,
Como por exemplo, no caso de um telefonema adiado, um agradecimento,
Um gesto de carinho, um sorriso, tudo adiado, deixado pra mais tarde,
Pela pressa dos negócios inacabados,
A gente vive assim, largados pela falta de tempo, um dia andando pela rua
Apressado como sempre, um corpo vazio pela pressa do dia a dia,
Esbarra com uma bala perdida, que também tem pressa em encontrar
Um alvo, um foi projetado para o outro, o corpo já não tinha vida, a
Bala só queria encontrar um alvo... O que será que havia naquele corpo?
Fé? Esperança? Amor? Dúvidas? Sonhos? O que será que havia?
Ou será que nele habitava apenas a pressa em chegar a algum lugar?
Não tenho a resposta, estou com pressa, preciso pegar o meu lugar no futuro...

Xico Fredson...

A Idade da Razão

A IDADE DA RAZÃO


Um dia nós descobrimos que não adianta ficar tentando dar nome ao inominável ou então ficar procurando o que não quer ser encontrado...
Um dia nós descobrimos que não somos eternos e que o tempo não volta, pelo contrário, ele se vai e continua se indo enquanto nós vamos nos tornando cada vez mais uma sombra do que fomos...
Um dia nós percebemos que rir de alguém mais velho é estar sorrindo da nossa projeção futura;
Um dia nós começamos a perceber que nossos reflexos já não estão tão apurados como antes e que a nossa agilidade está cada vez mais lenta, é como se passássemos a assistir ao filme de nossas vidas em câmera lenta...
Um dia se aprende que amor se faz com calma e tempo e não com ansiedade...
Um dia nós percebemos que nossos filhos cresceram, já temos netos, e que o papel de pai e filho se inverteu, hoje sou seu filho e você meu herói....
Um dia nós descobrimos que pra se ser feliz é preciso muito pouco, que a felicidade não se compra, ela é de graça, vai ver é por isso que não a aceitamos...
Um dia nós acordamos e nos olhamos no espelho e vemos aquele rosto estranho, cheio de rugas, os cabelos brancos, os olhos já sem aquele brilho castanho, o espelho dos olhos começa a ficar embaçado... o que fazer? De quem é esse rosto estranho no espelho? Onde está a fonte da juventude? Em que farmácia posso comprar um remédio que me faça sentir melhor, mais jovem? Onde?
Um dia nós descobrimos que a vida é uma mãe terrivelmente boa, com a mesma mão que ela dá, ela toma impiedosamente, e não adianta chorar, ela é surda;
Um dia nós descobrimos que nada existe, nem mesmo o tempo ou a eternidade, e que algumas coisas morreram, mas nós insistimos em não enterrá-las juntamente com os santuários...
Um dia nós aprendemos que é preferível caminhar a correr, uma vez que das duas formas se chega ao mesmo destino, a diferença é que daquela maneira se atinge o alvo com mais beleza e revelações...
Um dia a gente começa a entender a magia de se ouvir as pessoas ao nosso redor e de aprender aquilo que as crianças têm a ensinar...
Um dia, e não muito tarde espero, descobrimos que aquele que só existe porque nós queremos não habita em livros, que o pássaro sem-nome só pode cantar em liberdade, e que não adianta criar gaiolas de ouro ou prata, a melodia do seu cantar é como o vento, todos o ouvem só que de forma variada, embora ele cante sempre a mesma canção;
Um dia nós aprendemos a força que tem uma oração, e que não basta apenas ajoelharmo-nos diante de um modelo e postar as mãos num gesto de arrependimento, para com isso conseguirmos um bilhete no trem que parte pras estrelas;
Um dia nós descobrimos que a solidão é quem revela o grande mistério da vida, ele só tira o seu véu diante daquele que resolve aceitar o desafio de atravessar o deserto que se faz em nossas vidas, isso nos fará ver que o maior mistério da vida atende pelo nome de homem, o pão e o vinho, e para esse mistério não foi criado nenhum altar;
Um dia a vida se apresenta diante de nós com toda sua fúria, mostrando que não há crendices que nos protejam dela, e que as verdades que defendemos não nos conduzirão a outro lugar além de nós, da nossa arrogância, da nossa intolerância e ignorância, ela nos crucifica ao medo de descobrir a verdade dos livros de história... dessa forma jamais exorcizaremos os nossos fantasmas e tampouco conseguiremos ressuscitar para a aceitação do novo, da mudança, que como li escrito na camisa de um estudante do curso de história, “é a única coisa constante no mundo em que vivemos”, façamos a mudança então, ajamos como Don Quixote, “por amor as causas perdidas e contra os moinhos de vento”, mesmo que sejamos chamados de OTÁRIOS SONHADORES, jamais devemos esquecer a força da gratidão e a beleza do sorriso da rosa...
Um dia nós descobrimos que não há beleza em ser grande, em ser forte, em ser poeta...
Um dia andando pelas ruas, deparamo-nos com a “cidadania” deitada na calçada coberta com jornais, catando comida no lixo entre ratos e papel higiênico usado - “olha que coisa mais linda mais cheia de graça é uma família disputando sua comida no lixão no meio da praça”- a vemos na figura de um velho que cata papel na rua ou vende picolé pra sobreviver, em uma mãe com três filhos mendigando a vida de porta em porta, e recebendo a cidadania com a porta na cara do pobre.
A cidadania também nos vem aos olhos na figura das crianças que correm na rua sem destino, sempre repetindo a mesma bem dito: dá um trocado aí pra eu comer alguma coisa, moço... ou então praticando pequenos furtos sob o efeito da cola que deveria ser usada no tênis para vestir os pés descalços delas... a cidadania também se manifesta nas bravatas sociais, nas bandeiras da miséria empunhadas por um cavaleiro oportunista, pra quem a vida desses trapos humanos que habitam as ruas não passa de causas perdidas...
Um dia nós descobrimos que para sermos felizes é preciso apagar a imagem da cruz que nos impede o desenvolvimento espiritual, e veste tudo com um nome engraçado, pecado. Até mesmo o amor é pecado. Nós matamos a filosofia, a crucificamos e a enterramos em algum lugar desconhecido até hoje...
Um dia nós descobrimos que diante do nosso cansaço espiritual e físico não adianta nos desesperarmos, o desespero humano não cabe nesse momento da vida, devemos apenas ter calma e paciência para aprender o que as coisas da vida nos ensinam, agora elas começam a ter o sentido que nunca tiveram...
Um dia nós aprendemos que o verbo amar, transitivo direto, só se aprende se o conjugarmos com todos os nossos sentidos;
Um dia nós descobrimos que não precisamos envelhecer para aprender a valorizar a vida e enxergar as belezas que ela não se cansa de nos mostrar, seja num arrebol ou num crepúsculo, é isso que somos, somos um arrebol ao nascer e um crepúsculo ao envelhecer. É preciso reaprender a sorrir com a intensidade que a existência merece, mesmo que ela às vezes pese sobre os nossos ombros, essa é a única cruz que devemos carregar;
Um dia pode ser que não haja um outro dia pra que nós meditemos sobre a vida, o espetáculo vai acabar, as cortinas vão começar a baixar, e nem nos demos conta de que já estamos no nosso ultimo ato, o que fazer no último ato do seu grande espetáculo além de viver? O espetáculo é seu! Quanto ao meu, eu vou encerrar esse texto por aqui e vou dar uma volta por aí, sentir a vida pulsar na rua. Reconstruir-me a partir dos meus escombros, concertar uma coisa aqui, pintar outra ali, tirar uns excessos dos meus, aprender com meus erros e expectativas que me servem de alicerces, e me tornarei uma nova casa onde um novo eu vai habitar... Até que a morte venha demolir o meu castelo de areia...

Xico Fredson....

A gente cansa!

Chega um momento no dia, em que a gente cansa... Cansa de seguir, cansa de vir, cansa de se questionar e de questionar o seu semelhante, que muito provavelmente está cansado de ser questionado e vice-versa;Chega uma hora no dia, em que a gente cansa até de ser a gente. E por que não fazer como o outro sempre faz e parece dar certo? E por que não pegar o mesmo trem para as estrelas e seguir? Mas até mesmo esses porquês cansam... O gosto do café, os livros lidos, os filmes assistidos, as conversas tidas, as fúrias contidas, os sonhos sonhados, as contas a se pagar...tudo cansa, tudo esgota e definha!
Chega uma hora no dia, em que até questionar a existência ou não de um Deus nos cansa, e ele continua existindo e a gente começa a desaparecer diante de nossas palavras e das nossas vãs filosofias que nos deixam com a sensação de uma queda eterna;Chega uma hora no dia, em que a gente cansa da fúria do nosso tempo, da velocidade louca com que as coisas acontecem, de como essas mesmas coisas morrem ainda em germe; a gente cansa de tentar entender porque as pessoas são "assim", e por que somos pessoas...assim?Chega uma hora no dia, em que tudo o que a gente quer é rasgar a identidade e (re)nascer. Encontrar novas razões, novas paixões, recomeçar tudo do zero, até cansar novamente, parar novamente e recomeçar, sem ser chamado pelo mesmo nome... Humanum est!


Xico Fredson!